Diálogo da obsessão

Márcio Costa
27/02/2015
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Faltava pouco para começar a reunião pública, quando um senhor de aparência atribulada e meio tenso adentrou pelo corredor principal da Casa Espírita. Olhando de um lado para o outro, como se estivesse preocupado que suas condições emocionais estivessem sendo percebidas, sentou-se na primeira fileira de cadeiras daqueles que estavam esperando o atendimento fraterno.

Chegada a sua vez, levantou-se muito rápido, cruzou o corredor e adentrou a sala onde lhe esperava um senhora muito simpática, antiga trabalhadora da Casa. Esta, reconhecendo o visitante e percebendo a sua tensão emocional, esboçou um sorriso fraterno, tentando envolvê-lo em laços de paz para que ele ficasse tranquilo durante o atendimento.

– Como o senhor está, seu Florêncio? Em que posso ajudá-lo desta vez?

– Tudo bem, dona Hermínia? É, …não estou muito bem, não. Acabei voltando ao seu atendimento. A senhora se lembra de minha última visita?

– Sim, me lembro. O senhor alegava se sentir obsidiado e precisava de apoio do Centro. O senhor seguiu as minhas sugestões? Lembro-me de tê-lo convidado a frequentar mais a nossa Casa, passar pelas sessões de passe, buscar leituras mais dignificantes, cultivar a prece, e tentar mudar os hábitos, principalmente, os mentais? O senhor procurou fazer isso?

– Sim, fiz tudo que a senhora mandou. Passei a frequentar bem mais o Centro e no mês passado consegui até vir aqui duas vezes. Parei de ler somente as páginas policiais e agora leio o jornal inteiro. Quanto à mudança de hábito mental, tentei parar de ficar pensando nos obsessores. Só que não tem jeito, não. Acho que eles continuam me perturbando, pois sinto-me incomodado como se alguém estivesse me olhando o tempo todo. Aí cansei de fazer esforço. Em minha opinião, as duas sessões de passe que eu fui no mês passado deveriam ter dado resultado… Mas, sinceramente, fiquei meio decepcionado com o Espiritismo.

Dona Hermínia ouviu as explicações atenta e, com muita tranquilidade e paciência, voltou a conversar com o senhor Florêncio.

– Seu Florêncio, não se decepcione, não. Mas, o Espiritismo não é como um remédio para a dor de cabeça que o senhor toma e ela vai embora. Os processos obsessivos, seu Florêncio, ocorrem por conta de nossas imperfeições morais, assim como as doenças decorrem de nossas imperfeições físicas.

Conseguindo a atenção dele, ela continuou:

– Allan Kardec, no “Livro dos Médiuns”, classificou a obsessão em três níveis, de acordo com o grau com que a pessoa esteja envolvida em seus processos. No primeiro nível ele chamou de Obsessão Simples; no segundo, Fascinação: e no terceiro, Subjugação. A Obsessão Simples é aquela em mais comum na qual uma pessoa, sem perceber, devido às suas imperfeições morais, cria conexões com espíritos que se afinizam com suas ideias e passam a fazer parte de sua vida. Muitas das vezes estes espíritos lhe intuem com ideias fixas que nem sempre são as mais promissoras. Assim a pessoa pode sofrer “inquietações, desconfianças, inseguranças, enfermidades” que podem até mesmo conduzi-la a um leito.

– É mesmo, dona Hermínia? Será que nós já passamos por um processo deste?

– Sim, é provável. O senhor se lembra da pergunta número 459 do Livro dos Espíritos, quando Kardec pergunta se os espíritos podem interferir em nossos pensamentos e atos? A resposta é que a influência é muito maior daquela que possamos imaginar. Em certas vezes eles podem até nos dirigir!

– Nossa… E no caso da Fascinação, dona Hermínia, como é que acontece?!

– Neste caso – continua dona Hermínia – o problema é maior, pois pode ocorrer um vampirismo associado ao processo. Ondas mentais incessantes entre o obsessor e o obsidiado podem criar conexões muito fortes entre ambos. E o processo, iniciado por intermédio de induções telepáticas, pode chegar ao ponto do obsessor assimilar as atitudes e formas do obsidiado. Casos como este são lamentáveis e podem até levar o obsidiado ao desencarne.

– Ao mesmo tempo em que a senhora está me deixando tranquilo, eu começo a ficar assustado! – exclama Florêncio – Será que eu estou nesse caso?

– Já que começamos, vamos continuar, seu Florêncio. Falta só um – continua dona Hermínia com um sorriso fraterno – Vamos falar agora na Subjugação. Este, sim, é um caso grave! Em outras religiões costuma-se dizer que as pessoas envolvidas neste processo estão “possuídas”. Nesta situação, a interligação e influência do obsessor é tão forte sobre o obsidiado que muitas das vezes o espírito é quem assume o controle motor do encarnado. Este, então, passa a agir totalmente sob a ação do obsessor. Como exemplo, o senhor se lembra daquela passagem do Evangelho de Marcos em que Jesus expulsa os demônios de um obsidiado e os manda para os porcos? Ali é um caso bem típico. Segundo as escrituras, o homem já não tinha controle de si, estando totalmente dominado por seus obsessores.

Neste momento, dona Hermínia faz uma pequena pausa e observa fraternalmente o senhor Florêncio.

E percebendo a atenção dele diante do esclarecimento, ela finaliza:

– Seu Florêncio, é com muita alegria que o recebemos aqui em nossa casa. E sempre estaremos aqui para ampará-lo e procurar atendê-lo. Contudo, por mais que venhamos a nos esforçar para apoiá-lo, não teremos como ajudar se parte do esforço não vier acompanhado de algumas mudanças que o senhor precisar fazer em sua vida. Embora o senhor apresente, com toda razão, uma lista de indícios que podem indicar um processo obsessivo, a sua condição física e emocional denota que muitos de seus problemas partem de suas próprias atitudes. E elas, por sinal, geram planos mentais que acabam servindo de conexão para a espiritualidade inferior que se deleita com estes painéis.

Deixando-o mais tranquilo e lhe estendendo as mãos, ela conclui:

– Pode acreditar, seu Florêncio, os seus Espíritos Protetores e a sublime espiritualidade nunca lhe abandonam. Procure rezar com a sinceridade do coração; busque literaturas que possam realmente lhe ajudar, sem criar ideias decadentes; e confie sempre em Deus! A busca pela sua própria renovação moral será o ponto de partida para encerrar quaisquer influências e aproximações negativas.

Envolvido naquelas palavras entoadas de forma dócil, o senhor Florêncio levantou-se da cadeira renovado e mais confiante. Não havia Subjugação, não havia Fascinação, talvez uma Obsessão Simples. Mas ele podia lidar com isso, buscando o seu próprio progresso moral.

Cruzando os corredores novamente, foi para a sessão de passes e todos, que antes, em realidade, nem olhavam para ele, passaram a notar o seu sorriso espelhado a cumprimentar os trabalhadores da Casa.

Trata-se de uma estória fictícia, mas a tela de fundo é comum a muitos de nós. Os nossos envolvimentos com os processos obsessivos ocorrem por conta de nossas imperfeições morais. Em algum momento nossos pensamentos e atos criam planos mentais que atraem espíritos que ainda se comprazem com vibrações de padrão inferior. Abrindo as portas de nossas mentes, criamos conexões indesejáveis com visitantes que passam a nos acompanhar mais ou menos, conforme o interesse pelas ideias que alimentamos. Não raro também há outras situações em que os obsessores somos nós mesmos. Fruto de nossas próprias ideias fixas, por vezes obsediamos a nós mesmos. Em todos os casos, o mais importante é a contínua vigilância. Somente os esforços para nos inclinarmos ao bem e a condições morais mais elevadas permitirão nos livrar cada vez mais dos processos obsessivos.

Márcio Martins da Silva Costa

Referências:
Kardec, Allan. O livro dos médiuns. Tradução de Guillon Ribeiro. 80. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2007.
Xavier, F.C., Vieira, W. Evolução em Dois Mundos, pelo Espírito André Luiz, Parte I, Cap 15 – Vampirismo Espiritual.
Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos. Federação Espírita Brasileira, 2007.
Kardec, Allan. A Gênese. Federação Espírita Brasileira, 2007.
Curso de Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita. Livro III: Ensinos e Parábolas de Jesus – Parte 2: orientações espíritas e sugestões didático-pedagógicas direcionadas ao estudo do Espiritismo. Primeira Edição. Brasília [DF]: Federação Espírita Brasileira, 2010.

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