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O susto

agosto 20, 2015

richard-simonetti-menorO marido dormia, tranquilo, no quarto. Na sala, Zélia, insone, divagava… No coração, uma saudade imensa; no cérebro, uma lembrança inde­lével: a irmã, que falecera há exatamente um ano.

Duquinha fora uma personalidade marcante, inesquecível. Bonachona, sorridente, conservava si­nal aberto no trânsito da comunicação. Adorava conversar, cultivar amizades. A seu lado não havia espaço para mágoas.

– Tristeza – dizia – é lâmpada desligada no coração. A gente fica sem luz e calor. Tudo escuro e frio!…

Enfrentava problemas, como toda gente, mas, virtude rara, sabia rir das próprias mágoas, cerrando a porta aos sentimentos negativos e perturbadores.

Se fofocavam, sugerindo que o esposo parecia não levar a sério a fidelidade conjugal, explica­va:

– Pois é, comadre – assim chamava Zélia desde que fora madrinha de casamento de seu filho –, o Olinto tem tanto amor por mim que transborda, derramando-se em outras “searas”…

Se surgiam dificuldades financeiras:

– Comadre, descobri um regime infalível. Desta vez, afino a cintura: jejuo três vezes por se­mana!

Se os filhos perturbavam:

– Comadre, as crianças me santificam. Trei­no paciência o dia inteiro!

Nem mesmo quando acometida de progres­siva insuficiência cardíaca, que provocou seu fale­cimento, deu-se por vencida:

– Comadre, estou em tratamento de beleza espiritual. O corpo está um trapo, mas a alma ficará “joia”!

– Ah! Duquinha! – suspirou Zélia. – Adoraria vê-la agora. Deve estar uma “miss”, merecidamen­te. Pouca gente valorizou tanto a existência e en­frentou tão estoicamente o sofrimento.

Despertando de suas divagações, percebeu, em sobressalto, um vulto que se aproximava, vindo da cozinha.

– Meu Deus, um ladrão!

Pensou em chamar o marido. Conteve-se. Certamente o intruso estava armado. Poderia reagir com violência…

Esforçando-se inutilmente por conservar a calma, fitou-o, aguardando o tradicional “é um as­salto”, mas o que viu fez gelar o sangue em suas veias: ele parecia deslizar acima do chão!

Os cabelos eriçaram-se. Seu coração queria pular do peito! Não se tratava de um ladrão! Muito pior: era… um FANTASMA!…

– Não se assuste, comadre. Sou eu, a Du­quinha, em carne e osso, ou melhor, em fluido. Vivinha! E olhe como estou linda!

Zélia não estava para conversa. Apavorada, desejava gritar por socorro, a plenos pulmões, fugir em desabalada carreira… No entanto, sentia-se pe­trificada, a suplicar por dentro:

– Valei-me Jesus! Meu anjo de guarda, pro­tegei-me! Socorrei-me, Virgem Maria!…

– Não seja boba, comadre! Não gosta mais de mim, só porque estou vestida de fumaça?!

Prestes a desmaiar, afogando-se no próprio medo, Zélia implorou em pensamento:

– Eu a amo muito, Duquinha. Adoro você! Mas, pelo amor de Deus, comadre, vá embora. Só apareça em sonho! Morro de pavor!

Diante de seus olhos esbugalhados, a apari­ção diluiu-se na penumbra, sorrindo sempre. Em breves momentos, extenuada e trêmula, Zélia viu-se novamente sozinha na sala.

* * *

O Amor é a ponte sublime que liga a Terra e o Céu.

Nossos amados nos visitam frequentemente, velam por nós, preocupam-se com nosso bem es­tar.

No entanto, há muitas barreiras dificultando um contato mais estreito. Uma delas é a ignorân­cia, que nos induz a associar a presença dos Espíri­tos a supostos horrores sobrenaturais.

A Doutrina Espírita desenvolve abençoado trabalho de esclarecimento nesse sentido, habili­tando-nos a contatos mais proveitosos com a Espi­ritualidade, sem a barreira do medo.

Richard Simonetti

 

Nota do editor:
Imagem em destaque disponível em <http://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-113806/>. Acesso em: 20AGO2015.

Richard Simonetti IN MEMORIAM
Richard Simonetti IN MEMORIAM

Richard Simonetti é de Bauru, Estado de São Paulo. Nasceu em 10 de outubro de 1935 e Desencarnou em 03 de Outubro de 2018. De família espírita, participou do movimento desde os verdes anos, integrado no Centro Espírita Amor e Caridade, onde desenvolveu largo trabalho no campo doutrinário e filantrópico. Orador e Escritor espírita, teve mais de cinquenta obras publicadas.

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