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Operação despertamento

setembro 24, 2015

richard-simonetti-menorOlegário, nobre mentor espiritual, desenvol­via, há muito, abençoadas tarefas em favor de seus irmãos encarnados. Dentre eles, Flávio e Ernestina, velhos tute­lados seus, que compunham um lar razoavelmente ajustado, em companhia de dois filhos adolescen­tes.

Preocupava-se com eles. Ambos, já perto dos quatro decênios de existência, permaneciam alheios às tarefas que lhes competiam desenvolver junto a crianças carentes, conforme compromissos assumidos no Plano Espiritual. Religiosos de tradição, prendiam-se muito mais às fantasias da Terra, desligados das inspira­ções do Céu. Simplesmente flutuavam ao sabor das futilidades humanas, envolvidos com lazeres e prazeres, sem nenhum interesse em adquirir lastros de virtude e sabedoria.

Não eram inconsequentes. Cumpriam seus deveres profissionais e familiares, mas perdiam precioso tempo em relação aos objetivos de apren­dizado e renovação da jornada terrestre, estagiando voluntariamente na aridez das convenções munda­nas. Fazia-se imperioso ajudá-los de forma mais efetiva. Olegário estudou demoradamente o assun­to e planejou a Operação Despertamento, con­tando com a autorização e o apoio de seus superio­res na organização espiritual onde servia.

Passados alguns meses, Ernestina dava à luz um filho, após inesperada gravidez que driblara os anticoncepcionais, que usava com rigorosa disci­plina desde que ela e o marido decidiram evitar que mais filhos perturbassem sua festiva progra­mação existencial.

O aborrecimento pela frustração de seus propósitos não ultrapassou os limites da gestação, porquanto, tão logo nasceu, o menino tornou-se centro das atenções e alegrias da casa. Fazia por merecê-lo, bebê lindo, forte, calmo, sorridente — um santinho! Nos anos que se seguiram, Lucas revelou-se um garoto especial. Difícil definir o que o distinguia mais: se a precocidade, incrivelmente ativo e inteli­gente, ou o carinho envolvente que dispensava aos familiares; alegre, comunicativo, humilde, obediente — um anjo do Céu a iluminar a escuridão da Terra!

Flávio e Ernestina já não se empolgavam com os programas vazios a que estavam habitua­dos. Havia um bem mais atraente: curtir o filho, acompanhando seus passos seguros nos ensaios de vida. Anotavam, orgulhosos, seus progressos nas primeiras letras; contagiavam-se com sua exu­berante vivacidade; edificavam-se com sua vocação para a fraternidade, sensível aos sofrimentos alheios, nunca permitindo que necessitado algum batesse à porta sem algo receber.

Foram tempos inesquecíveis, de plena ven­tura, até que se deu a tragédia. Lucas adoeceu su­bitamente, febre alta, fortes dores de cabeça, man­chas escuras pelo corpo… O socorro médico foi providenciado rapidamente! Internação urgente, exames variados e… o diagnóstico terrível: meningite meningocócica do tipo B, a mais grave! Em poucas ho­ras, o menino faleceu!…

Angústia, perplexidade, desespero, revolta, estabeleceram sequência na­queles corações despreparados para as grandes do­res. Depois, o desencanto, a tristeza insuperável!… Nada os animava. Flávio e Ernestina com­portavam-se como sonâmbulos: falavam, alimenta­vam-se, trabalhavam, mas incapazes de retornar à normalidade, vinculados ao passado, como se vi­vessem interminável pesadelo.

Os dias seguiram seu curso. Sucederam-se os meses e o tempo repetiu o eterno milagre, re­compondo neles a vontade de viver. No entanto, nunca mais seriam os mesmos. Haviam perdido as ilusões! Festas, bailes, viagens, passeios, jogos, vida social — tudo o que os motivava tanto perdera inteiramente o sabor.

Manifestou-se neles uma insuspeitada voca­ção religiosa e, como ocorre com frequência em si­tuações semelhantes, encontraram consolo na Dou­trina Espírita, emocionando-se com as informações sobre a vida no Além e a perpetuidade das ligações afetivas. Uma nova alegria felicitou aquelas almas combalidas quando começaram a participar de ser­viços assistenciais, devotando-se particularmente a crianças carentes. Parecia-lhes, então, que Lucas estava junto deles.

Não se equivocavam. Olegário prestava-lhes carinhosa assistência, rejubilando-se com o suces­so da Operação Despertamento, que o levara a breve mergulho na carne, com a missão de arreba­tar seus tutelados do perigoso sorvedouro dos en­ganos humanos.

                                                                                       * * *

Aqueles que se debruçam sobre o esquife de uma criança, junto da qual sepultam suas alegrias e esperanças, precisam saber que nada acontece por acaso.

Há razões ponderáveis a determinar que Es­píritos retornem à Espiritualidade mais cedo, nos verdes anos da infância, envolvendo provações e resgates. E o fazem, também, como parte de um pro­cesso de iniciação dos pais em programas de des­pertamento, com vestibulares de sofrimento e sau­dade, como se Deus houvesse instituído a morte de crianças para ensinar os adultos a viver.

Richard Simonetti

 

Nota do editor:
Imagem em destaque disponível em <http://www.comunidadeesperanca.com.br/portal/index.php/16-coisas-de-mulher/45-por-que-as-mulhers-choram.html>. Acesso em: 23SET2015.

Richard Simonetti IN MEMORIAM
Richard Simonetti IN MEMORIAM

Richard Simonetti é de Bauru, Estado de São Paulo. Nasceu em 10 de outubro de 1935 e Desencarnou em 03 de Outubro de 2018. De família espírita, participou do movimento desde os verdes anos, integrado no Centro Espírita Amor e Caridade, onde desenvolveu largo trabalho no campo doutrinário e filantrópico. Orador e Escritor espírita, teve mais de cinquenta obras publicadas.

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