Escravidão é coisa de outra era?
Pergunta-se, ante inusitado espanto,
Ao ver-se o homem atado, inerte,
tanto
Que a antiga abolição desconsidera.
Será que a liberdade é coisa vera?
Põem-se a indagar os homens
angustiados,
Sentindo-se à nova cruz amarrados,
Por outros cirineus vivem à espera.
Como entender o gesto de Isabel,
A princesa famosa da alforria,
Ante a chibata e o eito de hoje em
dia?
Essa áurea liberdade é só papel…
Nosso Brasil vibra aos 500 anos,
Cento e doze vive a manumissão.
No entanto, há muitos filhos na
opressão
Sob fardos de horrores cotidianos.
É o crime arrasador da vida urbana,
Violência que gera a estupefação,
Associada às garras da corrupção.
E quem pensa que é livre assim
se engana.
Tantas crianças que vivem o
abandono,
A fome, a fria rua e a droga horrenda.
Mas, quem a tudo assiste usa sua
venda,
E, omissa, a cidade mantém-se em
sono.
São tantos velhos que, hoje
abandonados,
Não sabem qual será seu amanhã.
Depois de tanto esforço, com afã,
Vêem seus labores desconsiderados.
Há quem se enrica usando o pranto
alheio,
Sem consideração a qualquer dor.
Escravos do seu próprio desvalor,
Querem mais ouro, não importa o
meio.
Escrava, assim, multidão leva a vida
Com pose de nababo, indiferente,
Sem distender as mãos a tanta gente
Que roga amparo e segue combalida.
Há a escravidão de quem faz vista
grossa,
Ante as escolas de portas fechadas,
Ante hospitais que deixam
destratadas
Vidas com a dor que podia ser
a nossa.
Será que essa alforria é de verdade
Se as minorias sociais nunca acessam
Os bens mais comuns, ainda quando
peçam,
Se o conluio dos maus é enormidade?
Sabemos que p’ra tudo há uma razão.
Só Deus sabe explicar tudo na Terra.
Mas, o Evangelho ensinando não
erra:
Ai de quem dê ao mal motivação.
Vejo um grande futuro para o povo:
Letrado, honesto, saudável, feliz
Tendo passado, então, pelo tamis,
Da educação que produz
o homem-novo.
Há p’ro Brasil vindouro intensa luz
Que se projetará do coração
Que entenda, sob lúcida atenção,
Que a liberdade vera está em Jesus.
Sebastião Lasneau
Psicografia de J. Raul Teixeira, da obra Exaltação ao Brasil, ed. Fráter.