
Bendito os que têm olhos no coração
“Bem aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus.” Mt 5,8
Era uma noite de terça-feira do mês de junho de 1896.
Bezerra de Menezes presidira a uma das sessões públicas da Casa de Ismael.
Descendo as escadas da Federação Espírita Brasileira, com passos lentos e emocionados, avista um irmão, de seus 45 anos, cabelo em desalinho, com a roupa suja e amarrotada.
No encontro de seus olhos, Bezerra compreendeu logo que ali havia um caso para resolver.
Levando-o para um canto ouviu-o, com atenção, o desabafo, o pedido:
– Dr. Bezerra, estou sem emprego, com a mulher e dois filhos doentes e famintos… E eu mesmo, como vê, estou sem alimento e febril!
Bezerra apiedado verificou se ainda tinha algum dinheiro. Nada encontrou nos bolsos. Apenas a passagem do bonde…
Apiedado e apreensivo, levantou os olhos já molhados de pranto para o alto e, numa prece muda, pediu inspiração a seu Anjo Tutelar e solucionador de seus problemas. Depois, virando-se para o irmão:
– Meu filho, você tem fé em Deus?
– Tenho e muita Dr. Bezerra!
– Pois, então, em Seu Santíssimo Nome, receba este abraço.
E abraçou o desesperado irmão, envolvente e demoradamente.
E, despedindo-se:
– Vá, meu filho, na paz de Jesus e sob a proteção do Anjo da Humanidade. E, em seu lar, faça o mesmo com todos os seus familiares, abraçando-os, afagando-os. E confie no amor de Deus, que seu caso há de ser resolvido.
Uma semana depois, após a sessão de outra terça-feira, descendo as escadas da Federação; alguém, no mesmo lugar da escada, trazendo na fisionomia toda a emoção do agradecimento, toca-lhe o braço e lhe diz:
– Venho agradecer-lhe, Dr. Bezerra, o abraço milagroso que me deu na semana passada, neste local e nesta mesma hora. Daqui sai logo me sentindo melhor. Em casa, cumpri seu pedido e abracei minha mulher e meus filhos. Na linguagem do coração, oramos todos a Deus. Na água que bebemos e demos aos familiares, parece, continha alimento. Pois dormimos todos bem. No dia seguinte, estávamos sem febre e como que alimentados… E veio-me uma inspiração, guiando-me a uma porta, que se abriu e alguém por ela saiu, ouviu meu problema, condoeu-se de mim e me deu um emprego, no qual estou até hoje. E venho lhe agradecer a grande dádiva que o senhor me deu, arrancada de si mesmo, maior e melhor do que dinheiro! (1)
Bendito os que têm olhos no coração.
Abençoado seja aquele que em nome de Deus oferece um abraço, a verdadeira caridade desconhecida.
Não aguardemos a chegada do dinheiro farto e em abundância para fazer a caridade. Não o tendo dê algo de si mesmo, suas vibrações, o seu bom ânimo, a verdadeira moeda da alma.
“Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine.” (2)
Precisamos doar amor, na essência mais pura que conseguirmos exalá-lo.
Ao adentrarmos as portas benditas do Reino de Deus, de nada nos valerá as moedas do vil metal.
Despojados das vestes e da grandeza material seremos questionados sobre a quantidade de amor que doamos ao outro, aquele que divide conosco a mesma caminhada.
Centrados no egoísmo e na idolatria de nós mesmos, deixamos a caridade plena criar asas e, quando, enfim, quisermos reencontrá-la será necessário dissecar o amor que habita em nós e ficou adormecido.
Nós precisamos do outro e o outro habita em nós, somos um só, unido pela rede que forma a grande família universal.
A caridade está ao alcance de toda gente: do ignorante, como do sábio, do rico, como do pobre, e independente de qualquer crença particular. (3)
A verdadeira caridade não está somente na filantropia, mas, no conjunto de todas as qualidades do coração, na bondade e na benevolência para com o próximo. (3)
“Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.” (4)
Que a paz de Jesus esteja com todos.
Ângela Telles
Referências Bibliográficas:
(1) Gama, Ramiro – Lindos Casos de Bezerra de Menezes – 14 ª Edição – Nov. 2001 – LAKE- Livraria Allan Kardec Editora;
(2) Coríntios 13, 1;
(3) Evangelho Segundo o Espiritismo – Cap. XV – Item 7; e
(4) Coríntios 13, 13.
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