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Doadores de vida

janeiro 9, 2017

Célio Timbira entrou vacilante na agência bancária. Era sempre com uma sensação de pânico que voltava ao serviço, em sucessivas licenças-saúde.

Os médicos diagnosticavam o mal: neuro­se depressiva, que se manifestava particular­mente numa profunda insegurança em relação às suas atividades profissionais. Gostava do Banco, relacionava-se bem com os colegas… En­tretanto, experimentava insuperável mal-estar, presa de indefiníveis angústias. Os afastamen­tos totalizavam cinco anos, configurando cronici­dade.

Seus superiores o aconselhavam, frequentemente, à aposentadoria por invalidez. Era o que mais o perturbava. Não se considerava incapaz. Desejava trabalhar e vislumbrava nessas orienta­ções a mera intenção de se livrarem dele, como de um peso morto a ocupar o lugar de alguém em melhores condições.

Desta vez, nutria nova esperança. Consegui­ra transferência e era em outra agência que estava se apresentando, a contar com a torcida de seus familiares e amigos.

O encarregado do pessoal o recebeu com simpatia. Não obstante, o bancário estava terrivel­mente tenso. Certamente já lera sua fé-de-ofício, tomando conhecimento de seus problemas de saú­de. No entanto, ele nada comentou, limitando-se a encaminhá-lo para o setor onde serviria.

Célio esforçou-se por superar a velha insegu­rança. Concentrou-se nas tarefas e viu escoarem-se, menos angustiantes, as horas que compunham o expediente.

No final da tarde, foi chamado à gerência. Não havia surpresa. Até adivinhava a cantilena: de­veria esforçar-se por superar seus problemas, a fim de não prejudicar a si mesmo e ao Banco.

O gerente o cumprimentou gentil, acentuando:

— Meu caro Célio, tenho conhecimento de suas dificuldades e avalio quanto deve ter sofrido nessa sucessão interminável de licenças-saúde.

Fazendo-se forte, o bancário tenta contornar a situação, evitando o constrangimento da admoes­tação que, como bem conhecia, vinha sempre pre­cedida de amenidades, e diz, sem muita convicção:

— Não se preocupe, senhor gerente. Estou animado e bem consciente de minha situação. Não pretendo perder nenhum dia de serviço.

— Gostei de ouvir isso, meu rapaz! É preciso acabar com esses afastamentos que complicam sua carreira!…

“Oh! Meu Deus! Se me pressiona não vou conseguir!” — proclama Célio em desespero, na in­timidade de si mesmo.

— Façamos o seguinte: você virá diariamente à agência e assinará o ponto, garantindo o dia. De­pois, trabalhará durante o tempo que julgar conve­niente. Somente completará o expediente de seis horas se sentir-se em condições. Caso contrário, reduza a jornada para cinco, quatro, três, duas, uma hora… Seu compromisso será apenas com o ponto. Quanto ao mais, não se preocupe. Faça o que pu­der…

Célio tinha os olhos marejados de lágrimas. Jamais poderia conceber tão generosa concessão. Julgara receber reprimendas antecipadas e era pre­senteado com a liberdade plena. Ensaiou agrade­cimentos, extremamente sensibilizado…

— Não agradeça, meu filho. Estou apenas cumprindo o dever de ajudar um companheiro em dificuldade.

O bancário deixou a gerência com desco­nhecida sensação de leveza e bem-estar, disposto, como nunca, a superar suas dificuldades. E jamais se prevaleceu da concessão que lhe fora feita, cumprindo integralmente suas jornadas de trabalho e superando, em definitivo, o círculo vicioso das li­cenças-saúde. A generosidade do gerente devolve­ra-lhe a confiança em si mesmo.

* * *

Há uma permanente interação entre as cria­turas humanas. Influenciamo-nos uns aos outros com pensamentos, palavras, ações…

Por isso, há os agentes da Morte, que ani­quilam esperanças e aspirações, brandindo o látego da crítica ferina, do pessimismo, da agressividade, do desrespeito, mas há, também, abençoados doa­dores da Vida, que estimulam o crescimento do semelhante com manifestações de bondade, com­preensão, otimismo e confiança.

Richard Simonetti

Nota do editor:
Imagem ilustrativa e em destaque disponível em <http://www.blogdotrabalho.com/medico-fala-de-depressao-relacionada-ao-ambiente-de-trabalho/>. Acesso em: 09JAN2017.

Richard Simonetti IN MEMORIAM
Richard Simonetti IN MEMORIAM

Richard Simonetti é de Bauru, Estado de São Paulo. Nasceu em 10 de outubro de 1935 e Desencarnou em 03 de Outubro de 2018. De família espírita, participou do movimento desde os verdes anos, integrado no Centro Espírita Amor e Caridade, onde desenvolveu largo trabalho no campo doutrinário e filantrópico. Orador e Escritor espírita, teve mais de cinquenta obras publicadas.

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