Ética e moral na atualidade

Antonio Cesar Perri de Carvalho
01/06/2017
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Os momentos vividos no país provocam impactos na sociedade em geral e diversas abordagens têm sido realizadas para se compreender o cenário atual.

As análises com base na ética e na moral são sempre pertinentes.

Há muitos estudos acadêmicos que discutem os conceitos e a aplicação da ética e da moral, porém parece-nos oportuna a reflexão fundamentada na concepção espírita e de maneira mais simples.

Em geral, aceita-se que a ética procura distinguir o bem do mal, o justo do injusto, o certo do errado, o que é permitido e o que é proibido, tendo em vista o conjunto de normas adotadas por uma sociedade; seria mais especulativa. Já a moral se refere às normas ou regras que regem a conduta humana e envolve o dever e prática consciencial. A chamada consciência moral é a capacidade de decidir diante das alternativas possíveis, de distinguir o bem do mal. Portanto, a ética é o fundamento e a moral é a prática. Muitos entendem que ética e moral são inseparáveis.(1)

Allan Kardec, em suas obras, não empregou a palavra “ética”, mas o conceito e o objeto dessa estão implícitos em O Livro dos Espíritos e O Evangelho Segundo o Espiritismo. No livro inaugural do Espiritismo, o Codificador analisa as “Leis Morais” (2), e na Introdução de O Evangelho Segundo o Espiritismo, ele define o ensino moral como o objetivo desta obra. (3)

A ética cristã está fundamentada nos ensinos do Cristo, sintetizados na “regra de ouro”: “Tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós” (Mateus 7, 12). Em suas memoráveis Epístolas, Paulo de Tarso definiu diretrizes de ordem comportamental das quais destacamos alguns versículos (4):

“Examinai tudo. Retende o bem” (1 Tessalonicenses 5, 21); Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm; todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas edificam” (I Coríntios 10, 23); “Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem” (Romanos 12, 21); “[…] já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gálatas 2, 19-20).

O fato de Paulo citar o chavão da época referente à cidade de Corinto – “todas as coisas são lícitas” -, aponta para uma situação que o afligia. Os cristãos dos nascentes grupos de Corinto sofriam influências do contexto da época daquela cidade. O sábio grego Estrabão, no século anterior, já havia descrito a devassidão moral que grassava na importante cidade portuária e entroncamento para várias nações e culturas. A expressão “viver como um coríntio” referia-se a desregramentos comportamentais e que eram considerados “normais” naquela cidade. Essa questão ética e a tendência de adoção de práticas aberrantes, motivaram o apóstolo da gentilidade a elaborar a 1a Epístola aos Coríntios.(4)

Em seus textos Paulo desenvolveu o raciocínio de que alguns princípios que eram defendidos na sociedade local e da época precisavam ser observados através de diretrizes ligadas à conduta cristã, não se restringindo às normas que eles adotavam, e das quais dependiam tanto.

Respeitadas as diferenças, em tese, parece-nos que a colocação de Paulo está adequada ao mundo de nossos dias, e com predominância de ambientes de liberdade de pensamento, de legislações liberais e da facilidade de comunicação.(4)

No conjunto – Constituição do país, Leis e normas -, define-se o que é legal, o que é “lícito” no dizer de Paulo de Tarso.

Como ficariam as ideias de conveniência e de edificação que Paulo emprega na citada Epístola?

A mensagem essencial da Boa Nova fortalece princípios e o cultivo de virtudes. Sobre isso, o Espiritismo traz à tona a ideia do livre-arbítrio dentro dos conceitos que emanam do conhecimento de vida imortal e de reencarnação, e, dos compromissos do ser espiritual consigo mesmo e com a sociedade.

Nessa visão ampliada sobre o mundo, podemos também raciocinar sobre o que seria conveniente. O estudioso bíblico Champlin comenta que “conveniente” envolve “ajuda”, “benefício”, “proveito”, “utilidade”, “vantagem”, e, ao mesmo tempo relaciona com a ideia de “edificação”.(5)

A literatura espírita é muito rica de textos que se fundamentam na ética e na moral cristã.

Em O Livro dos Espíritos as abordagens são referentes à moral, como as questões abaixo2:

“Que definição se pode dar da moral?

– A moral é a regra de bem proceder, isto é, de distinguir o bem do mal. Funda-se na observância da lei de Deus. O homem procede bem quando tudo faz pelo bem de todos, porque então cumpre a lei de Deus.”

“Como se pode distinguir o bem do mal?

– O bem é tudo o que é conforme a lei de Deus; o mal, tudo o que lhe é contrário. Assim, fazer o bem é proceder de acordo com a lei de Deus. Fazer o mal é infringí-la.”

Allan Kardec, nas Leis Morais de O Livro dos Espíritos, destaca que a lei divina ou natural, a Lei de Deus, é “a única e verdadeira a conduzir o homem à felicidade e que lhe indica o que ele deve ou não fazer” e que essa “lei está escrita na consciência do homem.” (2)

A ética espírita está bem definida no livro inicial de Kardec ao examinar a Lei de Deus no tocante ao bem e o mal e ao apresentar essa lei subdividida em: leis de adoração, trabalho, reprodução, conservação, destruição, sociedade, progresso, igualdade, liberdade e, por fim, a de justiça, amor e caridade. Para Kardec “essa última lei é a mais importante, por ser a que faculta ao homem adiantar-se mais na vida espiritual, visto que resume todas as outras.” Sobre essa lei moral, Kardec enfatiza em O Livro dos Espíritos: “O progresso da Humanidade tem seu princípio na aplicação da lei de justiça, de amor e de caridade, lei que se funda na certeza do futuro.” (2)

A ética espírita baseia-se nas máximas morais do Cristo e busca o conhecimento da verdade.

A partir dessas colocações doutrinárias podemos analisar algumas situações de nossos tempos.

O comportamento ético-espírita não pode se limitar ao ambiente interno da instituição espírita ou no atendimento das carências do próximo e deve se constituir no nosso modo de ser e de agir em todas as circunstâncias da vida. Inclui os esforços de melhoria pessoal e no relacionamento dentro do contexto em que vivemos.

Os problemas morais do mundo são a miséria, a corrupção, a ambição, cuja matriz está no egoísmo. A propósito, Emmanuel discorre que “no mais desenfreado egoísmo, que provocou a crise moral do mundo, em cujos espetáculos sinistros podemos reconhecer que o homem físico, da radiotelefonia e do transatlântico, necessita de mais verdade que dinheiro, de mais luz que de pão.” (6)

O citado autor espiritual também alerta: “As vossas cidades não se encontram repletas de associações, de grêmios, de classes inteiras que se reúnem e se sindicalizam para determinados fins, conjugando idênticos interesses de vários indivíduos? Aí, não se abraçam os agiotas, os políticos, os comerciantes, os sacerdotes, objetivando cada grupo a defesa dos seus interesses próprios?”(6)

[…]

Na turbulência política e institucional que o país vive fica clara a debilidade de valores éticos e morais em vários níveis da sociedade brasileira. Todavia, num sistema democrático o povo tem muita responsabilidade na escolha de seus líderes. Assim, há indícios de que a enfermidade ética e moral tem raízes desde a base da sociedade.

[…]

Evocamos mais uma vez o apóstolo Paulo com seus marcantes registros. Anota a situação dele e, pode-se dizer de muitos, que adotam princípios ético-morais no contexto de nosso mundo:

“Desde agora ninguém me inquiete; porque trago no meu corpo as marcas do Senhor Jesus.” (Gálatas 6, 17)

Porém, deixa claro que a consciência tranquila e o dever cumprido são as melhores recompensas espirituais:

“Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé.” (2 Timóteo 4, 7) 

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Referências:
(1) Souza, Sonia Maria Ribeiro. Um outro olhar: filosofia. 1.ed. Cap. 10. São Paulo: FTD. 1995;
(2) Kardec, Allan. Trad. Ribeiro, Guillon. O livro dos espíritos. ed. 3a Parte, cap. II a XI; questões 629 e 630; Conclusão IV. Rio de Janeiro: FEB. 1989;
(3) Kardec, Allan. Trad. Ribeiro, Guillon. O evangelho segundo o espiritismo. 131.e. Cap. XI, item 11. Brasília: FEB. 2013;
(4) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Epístolas de Paulo à luz do espiritismo. 1.ed. 2 e 5. Matão: O Clarim. 2016;
(5) Champlin, Russel Norman. O Novo Testamento Interpretado: versículo por versículo. Vol. 4. São Paulo: Hagnos, 2014; e
(6) Xavier, Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. O consolador. ed. Questões 68, 127, 148, 170, 204, 345, 365. Brasília: FEB. 2013.

Nota do autor:
Transcrição parcial de artigo publicado na revista digital A Senda, da Federação Espírita do Estado do Espírito Santo: https://issuu.com/feees_oficial/docs/revista_para_revista.

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