O princípio científico da libertação do ser

Jane Maiolo
04/11/2017
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-Senhor, por ventura sou eu?

A narrativa, presente no Evangelho de Mateus, no capítulo 26, versículo 20 a 29, (1) tem-nos suscitado o entendimento intrigante sobre a inquirição dos discípulos ao Cristo após Este anunciar que: “Um de vós que está comendo comigo me entregará”. A revelação do Cristo soa como um alarme aos discípulos que mergulham no seu mundo consciencial e desejam encontrar as possíveis culpas que pudessem dar ensejo a uma anunciada traição.

A desarticulação emocional do momento faz com que os discípulos interroguem ao Cristo: “Senhor, por ventura sou eu?”, aguardando, quem sabe, uma resposta que os pudessem liberá-los do sentimento da culpabilidade, presente nas suas consciências ainda frágeis.

A questão da culpa remete-nos a um “pecado”, pois onde há “pecado” há culpa.

As religiões cristãs foram se estruturando ao longo dos séculos, principalmente após a concessão de liberdade de culto Cristão, pelo Imperador Constantino e a oficialização do Cristianismo como religião do Império Romano por Teodósio. Após esse período nascem os dogmas e surge o “pecado” da cruz.

A ideia do “pecado” porém é anterior a essa conquista. Nos antigos manuscritos são ancestrais a crença de que somos pecadores por herança de Adão.

O “pecado” adâmico foi lançado a toda a posteridade, conforme narra Paulo “Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram.” (2) Com a vinda do Cristo sobre a Terra, inicia-se no pensamento cristão o conceito de que Deus, o Pai, envia seu filho perfeito para nos tirar os pecados. Assegura o evangelista João – “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.” (3)

A Idade Média foi um campo fértil para a disseminação das ideias religiosas que manteve incondicional controle sobre as mentes dos “cristãos”, pois a possibilidade da “salvação” eterna estaria condicionada às práticas religiosas impostas pelo clero nas instituições.

Porém, novas perspectivas e auspiciosas esperanças surgem nos meados do século XIX com o advento do Espiritismo, consubstanciado no Consolador Prometido, que nos instrui sobre as etapas necessárias da contrição, da expiação e da reparação, a fim de que nos desvinculemos da culpa e libertemo-nos das amarras das impostas penalidades divinas sem remissão.

Onde algumas religiões cristãs divisam o “pecado” da cruz, que seus seguidores carregam no dorso, o Espiritismo nos instrui sobre a lição do perdão, da misericórdia e da sobrevivência da alma. É verdade! Em nossa imortalidade fomos empilhando experiência de vida pelos mecanismos da reencarnação e dentre os reflexos estampados em nossa história a culpa também retrata os desvios em face da nossa liberdade escolher e agir.

Portanto, sorvemos o cálice da culpa por vias transversais, seja pela indisciplina ante o buril educativo que advém nas experiências externas à nossa consciência, ou pelo uso da nossa autonomia de escolha, quando desobediente aos ditames da Lei, inscritas na consciência, nos remete às experiências traumáticas, caprichosas ou infelizes, que despedaçam a nossa essencialidade.

Os deslizes, falhas e crimes que praticamos, em eras remotas ou atuais, gravados na nossa memória espiritual, por vezes sobem à tona e vibramos na sintonia da desarmonia e da inquietação, infligindo-nos o mergulho nos mares profundos da tristeza.

Interessante que o prodígio do Déjà vu, muitas vezes, nos remete a sentimentos de nostalgia ou culpa nos arremessando nos infortúnios da consternação.

Sensata a recomendação da resposta dos espíritos à questão de número 242 de O Livro dos Espíritos, quando nos indicam que quando nos ocupamos com o passado ele é presente.(4) A imersão nas memórias transatas, principalmente as que trazem um teor de sofrimento e tristeza, estabelece a incursão de uma zona de remorso e passamos a projetar energias dilacerantes no campo mental, desvitalizando-nos e ficando à mercê das invasões microbianas fisiopsíquicas, muitas vezes alojadas devido ás predisposições mórbidas que trazemos registradas no nosso corpo perispiritual. (5)

Desse modo, naturalmente adoeceremos os corpos de manifestação do espírito, imprimindo transtornos de comportamento e por conseguintes desordens depressivas, além de variadas síndromes e patologias de etiologias estranhas.

A mente culpada institui uma usina de toxicidade, entretanto, como nos libertarmos da culpa?

André Luiz, no livro No Mundo Maior, Capítulo 4, intitulado “Estudando o cérebro” introduz o conceito do “Princípio científico de libertação do ser” , ensinando-nos que os remédios e as terapias libertadoras são as mesmas indicadas por Jesus, ou seja, a humildade frente às falhas, a reconciliação com o adversário, ou seja, com o eu profundo e o perdão a si mesmo, sem limites, indicando , também, a terapia do desabafo [circunspecto], que é um excelente mecanismo para dissipar as energias da culpa que impregnam todo nosso campo mental. (6)

Quando adentramos esses quadros graves na nossa existência, pode ser o início de um processo longo de recuperação da nossa conexão com as leis divinas. O espírito imortal começa a se incomodar com as impressões negativas que carrega no arcabouço das emoções e anseia libertar-se das opressões.

Entendermo-nos filhos de Deus e merecedores das benesses é terapêutica das mais sublimes e requintadas. Poderemos nos redimir e afastar os fantasmas da culpa, pois se um ato de amor cobre uma multidão de pecados, urge então não desperdiçarmos ocasião e amar sempre, principalmente a nós mesmos! (7)

Jane Maiolo

Referências:
(1) Mateus 26, 20 a 29;
(2) Romanos 5.12;
(3) João 1,29;
(4) KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed. FEB , 2007. Perg. 242;
(5) XAVIER, Francisco Cândido e Waldo Vieira. Evolução em dois mundos, ditado pelo André Luiz, segunda parte – cap. 19. -Brasília /DF: Ed FEB;
(6) XAVIER, Francisco Cândido. No Mundo Maior, ditado pelo André Luiz, cap.4 -Brasília /DF: Ed FEB.; e
(7) 1 Pedro 4.

Nota do editor:
Imagem ilustrativa e em destaque disponível em <https://www.crossroadsinitiative.com/media/articles/the-apostles-timid-men-who-won-the-world-john-chrysostom/>. Acesso em: 04NOV2017.

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